GERALDO
ZAMPRONI
No meio do caminho
2022
Dimensões: Diâmetro 1.10 x 2.30m
Site-specific
Poliestireno /Polystyrene.
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AIOP art in odd places – History – New York City – 14th Street – NY – USA (September)
No meio do caminho
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Pequena cidade no Brasil na década de 1960 sem eletricidade, sem água encanada e sem pavimentação; eu morava em uma casa de esquina. Perto morava Anita, uma menina muito simpática com o queixo deslocado para o lado, sua irmã adotiva era negra, em frente a casa dela morava uma família de evangélicos com muitos filhos, seu pai era carroceiro, ao lado deles morava a gorda viúva espanhola que vivia com filhos e um marido muito mais jovem. Na outra esquina morava a Inca, prostituta, mãe solteira, numa casinha com a mãe e muitos irmãos. Dona Maria gorda abordava alegremente todos os transeuntes que moravam em frente a minha casa, ao lado da casa dela uma família de negros adultos muito reservados. Na rua atrás da minha casa morava o Sr. Cícero, eles eram pretos, eu comprava queijo na casa dele quase que diariamente, o neto dele era amigo do meu irmão no grupo de teatro. O Renato era meu melhor amigo, o pai dele era rígido, mas viajava muito, a Laica, amiga da minha irmã, morava na frente da casa dele, tinha muitos irmãos, eram portugueses. Ao lado da minha casa moravam pessoas do nordeste do Brasil, só adultos e uma matriarca que se vestia de forma peculiar, do outro lado um casal com um recém nascido que eu adorava cuidar diariamente. Na esquina morava o japonês, tinha sete filhos, diziam que nesse caso o mais velho deveria ser padrinho de batismo do mais novo, senão virava lobisomem. Ele tinha uma barraca na feira e batia muito na égua que carregava suas mercadorias. A maioria estudava pela manhã, inclusive eu; à tarde brincávamos descalços nas ruas; depois de tomar banho e jantar ao entardecer, voltávamos a brincar na rua, sempre tinha um colega por perto e outro, e o outro só tinha que escolher o jogo. Durante a tarde, muitas vezes caminhávamos alguns quilômetros até um riacho para brincar na água, na volta íamos pela mata para comer frutas e balançar nas trepadeiras. Cresci assim, com gente, só gente, quando eu vejo isso: “Comunidades deficientes, BIPOC, LGBTQIA+ e afins...” é muito estranho, na minha formação só tinha gente. Assim, as pedras no caminho que são colocadas são falsas, só estão lá porque as pessoas destacaram os “diferentes”, se não me tivessem “avisado”, eu não teria notado, pois na minha formação não havia feio e bonito, negro, branco, aleijado, vadio, japonês, havia gente; só gente. Em Midway as pessoas poderão tocar na pedra do caminho e perceber que é falsa.
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Midway
Small town in Brazil in the 1960s with no electricity, running water and no paving; I lived in a corner house. Nearby lived Anita, a very nice girl with her chin dislocated to the side, her adopted sister was black, in front of her house lived a family of evangelicals with many children, her father was a cart driver, next to them lived the fat Spanish widow who lived with children and a much younger husband. On the other corner lived Inca, a prostitute, single mother, in a small house with her mother and many siblings. Dona Maria fat happily approached all the passers-by who lived in front of my house, next to hers was a family of very reserved black adults. In the street behind my house lived Mr. Cicero, they were black, I bought cheese at his house almost daily, his grandson was a friend of my brother's in the theater group. Renato was my best friend, his father was strict, but he traveled a lot, Laica, my sister's friend, lived in front of his house, had many brothers, they were Portuguese. Next to my house lived people from the northeast of Brazil, only adults and a matriarch who dressed in a peculiar way, on the other side a couple with a newborn that I loved to take care of daily. The Japanese lived on the corner, he had seven children, and they said that in that case the eldest should be godfather at the youngest's baptism; otherwise he would turn into a werewolf. He had a stall at the fair and beat the mare that carried his wares a lot. Most studied in the morning, including me; in the afternoon we played barefoot in the streets; after taking a shower and having dinner at dusk, we would go back to playing in the street, there was always a colleague around and another, and the other only had to choose the game. In the afternoon, we would often walk a few kilometers to a creek to play in the water, on the way back we would go through the woods to eat fruit and swing in the vines. I grew up like this, with people, only people, when I see this: “Disabled communities, BIPOC, LGBTQIA+ and the like...” it's very strange, in my background there were only people. Thus, the stones that are placed on the path are false, they are only there because people highlighted the “different”, if they had not “warned me”, I would not have noticed, because in my training there was no ugly and beautiful, black, white , crippled, stray, Japanese, there were people; just people. In Midway, people will be able to touch the stone on the way and realize that it is fake.
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